terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

"O Último Minuto na Vida de S." Miguel Real


Título: O Último Minuto na Vida de S.
Autor: Miguel Real
Editora: Quid Novi

Publicado em 2007, este é um livro que há muito queria ler e quando o vi numa promoção de uma grande superfície a apenas dois euros, fiquei sem desculpas para não o adquirir e ler.

O meu interesse sobre o livro tem que ver por ser sobre uma figura que me tem suscitado grande interesse desde que vi uma reportagem na SIC que lhe foi dedicada: Snu Abecassis. Como é sabido Snu Abecassis era dinamarquesa, de seu verdadeiro nome Ebba Seidenfaden, mas que desde pequena foi alcunhada pela sua família como Snu ("esperta"). Snu veio para Portugal após o seu casamento com Alberto Vasco Abecassis e foi a fundadora da editora Dom Quixote, a qual enfrentou alguns problemas com o Estado Novo, devido ao conteúdo alegadamente de esquerda de algumas das suas publicações. No período pós-revolução, Snu Abecassis iniciou uma relação amorosa com Francisco Sá Carneiro, fundador do PSD e primeiro ministro de Portugal em 1980, tendo ambos falecido em Dezembro desse mesmo ano na sequência da explosão sob Camarate do avião Cessna em que ambos seguiam. 
Devido ao seu fim trágico e abrupto bem como a própria ousadia que constituía a sua relação no Portugal dos anos 70, Snu e Sá Carneiro são tidos como protagonistas da última grande história de amor da história do nosso país. Mesmo antes da tragédia, foram muitos obstáculos que tiveram de enfrentar para ficar juntos, até porque ambos eram casados. Enquanto Snu e Vasco Abecassis se divorciaram, Isabel, esposa de Sá Carneiro, recusou conceder o divórcio e instigou os filhos a cortarem o contacto com o pai, com apenas um deles, Francisco, a ir viver com o pai, Snu e os filhos desta. Para o Portugal da altura, um primeiro-ministro decidir viver com uma mulher que não a sua esposa, ainda para mais sem estar divorciado, seria passível de ser algo condenável pela sociedade, mas o certo é que a relação vingou e Sá Carneiro fazia questão de que a mulher que amava o acompanhasse nos seus actos protocolares e ocupasse a posição prevista para a mulher de um primeiro ministro.    

Apesar do livro se assumir com uma ficção com vários nomes e elementos alterados (por exemplo, a protagonista é sueca e não dinamarquesa), não há dúvida que a voz desta S. que percorre o livro, a recordar os seus anos de vida em Portugal, será a de Snu Abecassis e que o autor Miguel Real, pretendia com esta obra, tentar reproduzir a visão que Snu Abecassis teria sobre Portugal. E sem dúvida que a perspectiva de Snu Abecassis teria de Portugal seria interessantíssima. Eis uma mulher nórdica, culta e crescida numa cultura fria, pragmática e de mente aberta que vem viver para um Portugal em plena ditadura, um país rústico, tacanho e agrilhoado. Suponho que para ela foi como passar do mais evoluído para o mais arcaico dos países e a adaptação tivesse sido tudo menos fácil. E no entanto, estou em crer que apesar de tudo, Portugal teve encantos que conquistaram esta nórdica além dos portugueses que ela amou. Também imagino como seria estranho para os portugueses, inclusivamente as forças do Regime, lidarem com esta mulher alta, loira e culta, que cultivava porém uma imagem austera e imperturbável apesar da sua beleza.

É de tudo isto que Miguel Real aborda em "O Último Minuto na Vida de S." onde a narradora, na iminência da desgraça prestes a acontecer a bordo do avião em que se encontra, recorda a sua vida em Portugal e relembra um país ao mesmo tempo esquecido na contaminação voraz dos costumes europeus mas ao mesmo tempo com certas semelhanças ao país que existe mais de trinta anos depois. É esse o principal mérito desta obra. 

No entanto, existe um aspecto que me impediu de apreciar mais o livro. As frases são demasiado longas, com diversos fragmentos e vírgulas. Só para se ter uma ideia, a primeira frase do livro atravessa treze páginas! Não tenho nada contra essa construção frásica, mas acabou por ser demasiado cansativo estar sempre a ler o livro assim.     

Sem comentários:

Enviar um comentário